sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Pouso de andorinhas


Hai-kai da palavra andorinha



A palavra andorinha


Freme devagarinho


E some em silêncio...



In: Mario Quintana - O Livro de Haicais

Organização: Ronald Polito

Ilustrações: Roberto Negreiros

Posfácio: Paulo Franchetti

Editora: Globo


Os poemas de Mario Quintana "– haicais ou não – compartilham com o pequeno poema japonês algumas características importantes: o gosto pelo humilde, pelo simples, pelo despojamento da vida pobre e solitária, a preferência pela linguagem quotidiana, a recusa à exibição técnica ou à busca do efeito fácil." Em palavras de Paulo Franchetti no posfácio do livro de Mario Quintana.


Imagem: Leda Lucas


Filosofia moderna x filosofia antiga


Gostei muitíssimo deste vídeo realizado pelo Monty Python.

Um pouco de humor na tarde.

Fonte: YouTube

Poesia e imagem

O poema de John Donne lembrou-me intensamente meu sentimento junto ao túmulo do poeta Pablo Neruda e Matilde, em Isla Negra, no Chile.

Naquele momento, estudantes e turistas buscavam o entendimento do que é o amor? Qual a força dos desejos de um poeta?

A vida é êxtase?

O poema Êxtase de John Donne traduzido por Augusto de Campos foi postado a partir de visita que fiz hoje, dia 29 de janeiro de 2010, ao blog de Lau Siqueira: http://poesia-sim-poesia.blogspot.com/


Êxtase

(John Donne)


Onde, qual amofada sobre o leito,


Grávida areia inchou para apoiar


A inclinada cabeça da violeta.


Nós nos sentamos, olhar contra olhar.




Nossas mãos duramente cimentadas


No firme bálsamo que delas vem,


Nossas visitas trançadas e tecendo


Os olhos em um duplo filamento;




Enxertar mão em mão é até agora


Nossa única forma de atadura


E modelar nos olhos as figuras


A nossa única propagação.




Como entre dois exércitos iguais,


Na incerteza, o Acaso se suspende,


Nossas almas (dos corpos apartadas


Por antecipação) entre ambos pendem.




E enquanto alma com alma negocia,


Estátuas sepulcrais ali quedamos


Todo dia na mesma poesição,


Sem mínima palavra, todo dia.




Se alguém – pelo amor tão refinado


Que entendesse das almas a linguagem,


E por virtude desse amor tornado


Só pensamento – a elas chegasse,




Pudera (sem saber que alma falava


Pois ambas eram uma só palavra),


Nova sublimação tomar do instante


E retornar mais puro que antes.




Nosso Êxtase – dizemos – nos dá nexo


E nos mostra do amor o objetivo,


Vemos agora que não foi o sexo


Vemos que não soubemos o motivo.




Mas que assim como as almas são misturas


Ignoradas, o amor reamalgama


A misturada alma de quem ama,


Compondo duas numa e uma em duas.




Transplanta a violeta solitária:


A força, a cor, a forma, tudo o que era


Até aqui degenerado e raro


Ora se multiplica e regenera,




Pois quando o amor assim uma na outra


Interinanimou duas almas,


A alma melhor que dessas duas brota


A magra solidão derrota,




E nós que somos essa alma jovem,


Nossa composição já conhecemos


Por isto: os átomos de que nascemos


São almas que não mais se movem.




Mas que distância e distração as nossas!


Aos corpos não convém fazermos guerra:


Não sendo nós, são nossos.

Nós as
Inteligências, eles as esferas.



Ao contrário, devemos ser-lhes gratas


Por nos (a nós) haverem atraído,


Emprestando-nos forças e sentidos:


Escória, não, mas liga que nos ata.




A influência dos céus em nós atua


Só depois de se ter impresso no ar.


Também é lei de amor que alma não flua


Em alma sem os corpos transpassar.




Com o sangue trabalha para dar


Espíritos, que às almas são conformes.


Pois tais dedos carecem de apertar


Esse invisível nó que nos faz homens.



Assim as almas dos amantes devem


Descer às afeições e às faculdades


Que os sentidos atingem e percebem,


Senão um príncipe jaz aprisionado.




Aos corpos, finalmente, retornemos,


Descortinando o amor à toda gente;


Os mistérios do amor, a alma os sente,


Porém o corpo é para as páginas que lemos.




Se alguém – amante como nós – tiver


Esse diálogo a um ouvido a ambos,


Que observe ainda e não verá qualquer


Mudança quando aos corpos nos mudamos.




(O Êxtase, poema do norte-americano John Donne, 1573-1631. Tradução de Augusto de Campos)


Alguns dados biográficos:

John Donne - "Nascido no seio de uma família católica nesta época, mas que desde cedo teve que se virar sem o pai, que morreu durante sua infância, foi educado em uma escola jesuítica. Posteriormente estudou em Harvard e Cambridge. Teve um irmão morto na prisão, pois acolhera um padre condenado em sua casa. Questionou sua fé por conta disto. Foi um, digamos, boêmio que gastou a herança deixada pelos pais esbanjando dinheiro em farras, mulheres e viagens.

Casou-se com a sobrinha de seu patrão, que estava com 17 anos e isto foi a sua derrocada. Casou secretamente e foi preso! Tempos depois seu casamento foi reconhecido e tiveram 20 filhos, sendo que sua esposa morreu no parto deste vigésimo filho.

Incompreendido em sua própria época e esquecido por quase trezentos anos, John Donne ressurge como uma voz do nosso tempo, com angústias existenciais que pouco diferem das que afligem o homem contemporâneo, e com técnicas audaciosas, em grande parte incorporadas à poesia moderna.

Ao transfomar emoções religiosas numa poesia metafísica de rara beleza e profundidade, Donne seduz, comove – e faz pensar. Autores como T.S. Eliot jamais negaram a influência desse extraordinário contemporâneo de Shakespeare. Ernest Hemingway foi buscar na sua prosa o título para o romance Por Quem os Sinos Dobram.

Aqui no Brasil, Augusto de Campos traduziu o poema Elegia XIX: Indo para a Cama, que teve colocada uma belíssima melodia por Péricles Cavalcanti e gravada por Caetano Veloso no LP Cinema Transcedental. O texto foi reduzido, é claro, para caber no tempo de uma canção.(...)"

In: http://recantodaspalavras.wordpress.com/2007/10/20/john-donne-elegia/


Poema original, abaixo:


The Ecstacy

(John Donne)


WHERE, like a pillow on a bed, 


A pregnant bank swell'd up, to rest 


The violet's reclining head, 


Sat we two, one another's best. 



Our hands were firmly cemented 


By a fast balm, which thence did spring; 


Our eye-beams twisted, and did thread 


Our eyes upon one double string. 




So to engraft our hands, as yet 


Was all the means to make us one; 


And pictures in our eyes to get 


Was all our propagation. 




As,'twixt two equal armies,

Fate 
Suspends uncertain victory, 


Our souls —which to advance their state, 


Were gone out— hung 'twixt her and me. 




And whilst our souls negotiate there, 


We like sepulchral statues lay; 


All day, the same our postures were, 


And we said nothing, all the day.




If any, so by love refined, 


That he soul's language understood, 


And by good love were grown all mind, 


Within convenient distance stood, 




He —though he knew not which soul spake, 


Because both meant, both spake the same— 


Might thence a new concoction take, 


And part far purer than he came. 




This ecstasy doth unperplex

(We said) and tell us what we love; 


We see by this, it was not sex; 


We see, we saw not, what did move: 




But as all several souls contain 


Mixture of things they know not what, 


Love these mix'd souls doth mix again,


And makes both one, each this, and that. 




A single violet transplant,


The strength, the colour, and the size — 


All which before was poor and scant —


Redoubles still, and multiplies.




When love with one another so 


Interanimates two souls, 


That abler soul, which thence doth flow, 


Defects of loneliness controls.




We then, who are this new soul, know, 


Of what we are composed, and made, 


For th' atomies of which we grow 


Are souls, whom no change can invade. 




But, O alas! so long, so far, 


Our bodies why do we forbear? 


They are ours, though not we; we are 


Th' intelligences, they the spheres. 




We owe them thanks, because they thus 


Did us, to us, at first convey, 


Yielded their senses' force to us, 


Nor are dross to us, but allay. 




On man heaven's influence works not so, 


But that it first imprints the air; 


For soul into the soul may flow, 


Though it to body first repair. 




As our blood labours to beget 


Spirits, as like souls as it can; 


Because such fingers need to knit 


That subtle knot, which makes us man; 




So must pure lovers' souls descend 


To affections, and to faculties, 


Which sense may reach and apprehend, 


Else a great prince in prison lies.




To our bodies turn we then, that so 


Weak men on love reveal'd may look; 


Love's mysteries in souls do grow, 


But yet the body is his book. 




And if some lover, such as we, 


Have heard this dialogue of one, 


Let him still mark us, he shall see 


Small change when we're to bodies gone.


Fonte: http://www.pierdelune.com/donne2.htm

Imagem: Leda Lucas