quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Àqueles que gostam, amam mesmo, a lida com as coisas da linguagem, este poema de João Cabral de Mello Neto,


Catar feijão

1.

Catar feijão se limita com escrever:
joga-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo:
pois para catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco. 


2. 

Ora, nesse catar feijão entra um risco:
o de que entre os grãos pesados entre
um grão qualquer, pedra ou indigesto,
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a como o risco.


O poema Catar Feijão faz parte do livro A Educação pela pedra, de João Cabral de Melo Neto, cuja primeira edição foi publicada em 1965.

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Ilustração – Santa Rosa - Parte III




Já com saudades de meu livro, que está emprestado, continuo as postagens das ilustrações de Santa Rosa para o romance Crime e Castigo, de Fiódor Dostoiévski, cuja edição foi revisada por João Guimarães Rosa.
Desta publicação das obras completas do autor russo participaram muitos artistas brasileiros geniais.

Fotos dos desenhos: Leda Lucas

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