sábado, 13 de fevereiro de 2010

Catavento flor


Hoje, com muito custo e vencendo a alta temperatura, resolvi que levaria os meus óculos para o oftalmologista verificar a sua confecção, pois não estou me acostumando com ele.
A Av. Rebouças no sentido centro da cidade, simplesmente não andava. A fila de ônibus era de dar sono na gente e, de fato, no ônibus, a não ser um jovem baiano que parecia muito animado com a cidade, contava enormes vantagens de sua Salvador. Apenas ele falava. Os outros modorrinhavam a morna meia tarde. Eu, inclusive.
Lia um pouquinho A volta ao dia em 80 mundos de Cortázar, na parte em que o autor comenta a arte poética com fragmentos do romance Paradiso, de José Lezama Lima, escrito em letras miudíssimas. Ah, como a gente se entrega nos detalhes do viver; não?
Um tempo muito longo passou e cheguei ao balcão da Clínica. E a fatídica pergunta: "A senhora trouxe a receita? O guarda-chuva, eu havia já me certificado de que não o trouxera. Mas, a receita há dias carrego-a comigo em um daqueles tantos estojos de óculos - este azul.
E a viagem atordoante ao interior da bolsa. E a constatação: Não trouxe, moço. Sem a receita, não dá. Está bem. Voltarei, quando?
Saí do prédio, sem ofensas. O que fazer?
Enquanto acertava-me em meu destino, subi um pouco a calçada no sentido do centro da cidade, mas o tronco de uma árvore, enfiado literalmente na calçada, chamou-me a atenção. Para que pus nele meus olhos? Era uma árvore de tronco não tão grosso e parece que ele precisou vencer alturas em busca de sol; é esguia. Mas os cachos de flor em seus galhos, as folhas, os botões. Ah, os botões: catavento-flor! Ou mandala vegetal no céu da cidade.
Fiquei em tal estado de euforia que nem consegui fazer uma boa foto.
E aí está um pedacinho de meu contentamento na tarde de hoje em que uma árvore, que segundo o porteiro do prédio da Clínica de Olhos a quem perguntei se ele sabia o nome daquela árvore, é indiana e tem mais ou menos 12 anos e que foram plantadas duas, porém apenas esta sobreviveu. E, também, contou-me que é a primeira vez que ela "bota tanta flor". Tudo isto falou-me com um sorriso no rosto todo; e que não estava ali antes.

Imagem: Leda Lucas
Crônica: Leda Lucas
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